Abilio era um negro, não sei bem de que etnia (Nianja ou Niungue, uma das duas mais representativas da província), de modos educados, de estatura baixa e testa alta.
Era o nosso criado em Tete.Tinha uma educação e um trato que o destinguia dos outros criados. Não gostava que estivesse nas traseiras, nas escadas dos criados, nem que entrasse na casa onde comiam (aonde a minha mãe me foi buscar várias vezes...).
Brincava comigo quando não tinha amigos.
Lembro-me as filas de cegos que iam pedir a casa e que ele corria com rispidez. Lembro-me da sua mulher e filhos terem morrido, afogados quando a piroga se virou no Zambeze. Lembro-me do meu pai ter pago a bebedeira e o corte de cabelo rapado (costume local quando morria alguém).
Não me lembro quando me despedi dele. Mas sei que o meu pai perguntou se queria vir connosco.
Lembro os embondeiros, a fruta-pão, a terra vermelha e os montes de terra feitos pelas formigas. Lembro o Zambeze.
Quando penso em Moçambique, penso no Abilio. O que foi feito dele. Adeus Abilio.
(Fotografia Novembro de 1973)
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"Há um tempo em que é preciso
abandonar as roupas usadas
Que já têm a forma do nosso corpo
E esquecer os nossos caminhos que nos
levam sempre aos mesmos lugares
É o tempo da travessia
E se não ousarmos fazê-la
Teremos ficado para sempre
À margem de nós mesmos."
(Fernando Pessoa)
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